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Um novo cenário para o setor financeiro no Brasil

Departamento analisa as consequências do novo cenário para os trabalhadores

Fonte: Dieese

Um novo cenário para o setor financeiro no Brasil[1]

Juros, spreads e tarifas bancárias mais baixos: possíveis respostas do setor ao novo cenário e as consequências para os trabalhadores

 

Nos últimos anos, consolidou-se no âmbito do governo federal a insatisfação com os níveis elevados das taxas de juros praticadas no país. Passou a predominar o entendimento de que os spreads bancários – diferença entre a taxa de empréstimo do banco e o custo de captação, ou seja, a margem de ganho bruto dos bancos – praticados no Brasil são demasiadamente elevados em comparação à média internacional, comprometendo a continuidade do processo de desenvolvimento econômico. Tal situação derivaria diretamente do elevado grau de concentração do setor bancário brasileiro e da elevada taxa básica de juros, que determina um patamar mínimo de valorização do capital, empurrando as demais taxas para cima. A partir deste diagnóstico, o governo federal passou a agir em duas frentes.

Em agosto de 2011, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil iniciou um processo gradual de redução da Taxa Selic[2]. Desde então, a taxa caiu gradativamente de 12,5% ao ano até 7,25% ao ano, em outubro de 2012, o menor patamar verificado no último período. A importância deste processo reside, entre outros motivos, no incentivo que a redução da taxa de juros tende a gerar sobre os investimentos produtivos. Ao mesmo tempo, propicia a liberação de recursos públicos, antes destinados a pagamento do serviço da dívida pública para outras destinações, à medida que uma taxa de juros básica menor reduz o montante de recursos transferidos da sociedade para os detentores de riqueza financeira.

A redução da Selic afetou a rentabilidade das instituições financeiras em dois âmbitos. Por um lado, os bancos – detentores de um volume expressivo de títulos da dívida pública – sofreram, desde então, uma queda das receitas vinculadas a estes ativos. A outra fonte de receita dos bancos afetada refere-se aos depósitos compulsórios[3], também remunerados pela Selic. Assim, num primeiro momento, a queda na Taxa Selic reduziu os ganhos financeiros de curto prazo, alta rentabilidade e baixo risco, que asseguraram por muitas décadas os elevadíssimos ganhos dos bancos no país.

Outra medida encampada pelo governo federal foi acionar os dois grandes bancos públicos federais para iniciarem um movimento de redução de suas taxas, na expectativa de que os bancos privados os acompanhassem sob o risco de perderem mercado. Em abril de 2012, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal apresentaram programas que englobavam reduções de taxas de juros em diversas modalidades creditícias e logo foram seguidos por seus maiores concorrentes privados. Como resultado, o spread geral da economia brasileira caiu, apesar de situar-se ainda em um patamar elevado na comparação com padrões de nível internacional.

No início do processo de redução de juros, argumentava-se que as instituições financeiras não perderiam, necessariamente, rentabilidade, uma vez que havia no país tanto uma grande margem para crescimento das operações de crédito, como, também, uma enorme parcela da população brasileira sem acesso a serviços bancários e com condições de acessar crédito, devido ao aumento do nível de emprego e renda observado nos últimos anos.

Dessa forma, os bancos precisariam mudar a estratégia de negócios, passando a ganhar menos na rentabilização de cada operação e mais no volume de operações. De fato, entre março de 2012 e janeiro de 2013, a relação crédito/PIB elevou-se, passando de 49,2% para 53,2%. No entanto, esse crescimento se deu, basicamente, em função do aumento das operações nos bancos públicos. Além de novos créditos, observou-se um forte movimento de migração de créditos de bancos privados para os públicos, através da portabilidade.

Uma reação das instituições financeiras, às medidas adotadas pelo governo federal, se traduziu na tentativa de compensar possíveis perdas de rentabilidade com a elevação de um componente secundário, porém importante, de suas receitas: as tarifas bancárias. Diante disso, novamente, os bancos públicos foram acionados pelo governo federal para iniciar um processo de redução de tarifas, com o objetivo de forçar a queda dos valores praticados pelos seus concorrentes privados.

Uma avaliação preliminar desse cenário sinaliza que a efetividade e a intensidade dessas mudanças, ainda em curso, são incertas, pois dependem da resposta das instituições financeiras frente à tentativa do governo de alterar a cultura rentista. Como, então, poderão as empresas do setor agir daqui em diante? A análise do discurso empresarial indica os possíveis caminhos a serem percorridos pelos bancos.

Uma primeira visão, externada pelos presidentes do Bradesco, da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil, avalia de forma positiva a redução de juros e dá a entender que se acredita nas condições objetivas da economia brasileira para que isso ocorra. O Itaú Unibanco, por sua vez, preconiza a necessidade de melhorar a eficiência. Para tanto, o banco lançou mão de uma série de ajustes compreendendo cortes de custos que tem se traduzido, predominantemente, em demissões. Política similar vem sendo adotada também pelo banco espanhol Santander, que vem demitindo muitos trabalhadores no Brasil, principalmente a partir dos últimos meses de 2012.

Vale lembrar que também está presente na argumentação empresarial a aposta no processo de bancarização por meio da disseminação dos correspondentes bancários e de novas modalidades de pagamento, através, por exemplo, do telefone celular ou smartphone. Esse é um provável novo modelo de atendimento bancário no Brasil, que viria substituir o atual. Um modelo baseado em agências e postos de atendimento, que requer investimento, relativamente elevado, em tecnologia, vigilância e pessoal.

Note-se, finalmente, que nas reuniões do Copom (em 17 de abril e 29 de maio de 2013), o Comitê voltou a elevar a taxa Selic ao patamar de 8%, dado o diagnóstico do Banco Central sobre os determinantes da inflação. Apesar de ser ainda muito cedo para se depreender conclusões dessa última medida, é possível afirmar que se o Copom der prosseguimento à política gradual de redução da Selic, em direção aos padrões internacionais, após os últimos ajustes ocorridos em abril e maio, outro cenário se estabelecerá. Dada a atual conjuntura econômica brasileira nos próximos anos, ao que tudo indica, o setor bancário passará por uma nova onda de ajustes, seja introduzindo novas tecnologias, objetivando a redução de custos (o que tende a impactar negativamente o nível de emprego no setor), seja buscando novas fontes de receitas que compensem a queda das atuais ou mesmo ampliando sua base de clientes. A conferir.



[1]              Este texto faz um resumo da Nota Técnica n.º 123, publicada em abril de 2013 pelo DIEESE. Para ler a versão integral, acesse o endereço eletrônico http://www.dieese.org.br/notatecnica/2013/notaTec123CenarioSetor Financeiro.pdf

[2]              Selic significa Sistema Especial de Liquidação e Custódia, e é o sistema responsável pela negociação dos títulos públicos. Através dele são feitas todas as operações de liquidação financeira e também de custódia dos títulos. Assim, em linhas gerais, a Taxa Selic funciona como um piso para a formação dos demais juros cobrados no mercado para financiamentos e empréstimos.

[3]              São os recolhimentos obrigatórios de recursos que as instituições financeiras realizam junto ao Banco Central com a finalidade de controlar a liquidez da economia e proporcionar estabilidade ao sistema financeiro.