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ARTIGO - Ultraliberalismo

O Estado liberal moderno foi criado como forma de garantir a paz e a segurança para as pessoas, uma vez que, no anterior estado da natureza (conforme Hobbes), viviam em permanente guerra e destruição.

 

(Foto: Adriana Medeiros)

 

Por Jorge Folena, cientista político e advogado

O Estado liberal moderno foi criado como forma de garantir a paz e a segurança para as pessoas, uma vez que, no anterior estado da natureza (conforme Hobbes), viviam em permanente guerra e destruição.

Porém, o Estado criado para dar segurança à propriedade e garantir as liberdades individuais, não foi suficiente para atender às necessidades humanas. Por isso, com a evolução do liberalismo político, tornou-se necessário que fossem concedidos direitos sociais, como forma de estabilizar os muitos conflitos humanos. Assim, por meio do consenso político, econômico e social, buscou-se a harmonia imprescindível para a evolução da sociedade.

Nesse passo, foram os liberais que criaram o Estado-providência ou do bem estar social; foram os liberais que estabeleceram, a partir do utilitarismo, que o interesse coletivo deveria prevalecer sobre o individual. Desta forma, todo um sistema de solidariedade foi constituído nos países ocidentais, com a finalidade de prover de forma gratuita a educação, a saúde, o transporte público e a previdência e assistência social.

Tudo isto foi construído e colocado em prática pelos liberais, e não exclusivamente por socialistas ou comunistas, que têm entre seus fundamentos a solidariedade e a boa vontade entre os homens, a exemplo do que prega o cristianismo.

Porém, o que tem ocorrido no mundo, nos últimos tempos, é o extermínio de todos os sistemas de proteção social e de solidariedade, outrora constituídos para proteger os homens, motivo de criação do Estado moderno. Induzidos por falsos motivos, os homens são jogados uns contra os outros, o que os leva a uma situação de conflito permanente; por outro lado, as causas de todo esse mal-estar contemporâneo são distorcidas, de forma a serem atribuídas ao Estado.

O Estado não pode ser um mal em si, uma vez que foi criado pelos liberais para estabelecer a paz e a segurança social, bem como para criar um sistema de proteção social para seus associados (os cidadãos, que se unem e pagam tributos para obterem os serviços públicos).

Na verdade, o que tem triunfado, como uma quimera, é o discurso do mercado financeiro, em que pouquíssima gente ganha dinheiro em demasia, sem trabalhar, e que age disseminando boatos e especulações como essas, que propõem para os desavisados que a raiz de todo mal é o Estado; que, por isso, deve ser extinto para que o mercado financeiro possa fazer o que bem entende, sem qualquer fiscalização.

Esta prática, na primeira década do século XXI, impôs ao mundo duas grandes crises do capital, em consequência da ausência de fiscalização proposta pelo mercado financeiro. A primeira foi em 2002, com a quebra da gigante empresa americana do setor de energia, Enron, cujos dirigentes fraudaram os balanços da empresa para inflar seus lucros. Em 2008, ocorreu a falência do banco americano Lehman Brothers, em consequência da manipulação da concessão de empréstimos bancários. Nas duas situações, cujos efeitos se percebem até hoje, a causa foi a proposta de um estado mínimo, no qual o mercado é seu próprio fiscal e o Poder Público não pode intervir em nada, devendo abster-se de prestar qualquer tipo de serviços.

 

 

Esses agentes do mercado financeiro, que praticaram fraudes contábeis e simularam a concessão de financiamentos, que impuseram a grave crise econômica que a humanidade tem experimentado neste século XXI (que tem sido debelada mediante a transferência dos recursos dos cidadãos para os bancos e as empresas falidas), são os mesmos que defendem, com todo descaramento, que deve ser demolido todo o sistema de solidariedade e de proteção social (que provê previdência social, educação, saúde etc.), construído pelos liberais a partir das idades moderna e pós-moderna.

Estes homens do mercado financeiro, como o atual ministro da Fazenda Henrique Meirelles, defendem o fim do Estado para que pouquíssimas pessoas no mundo possam triunfar e viver da exploração de todo o resto.

Isto é o que se denomina ultraliberalismo, que propõe a máxima exploração dos homens (sem se importar com nacionalidade, raça, gênero etc.), da forma mais perversa e cruel, que atenta diretamente sobre a vida, o direito natural por excelência, segundo Hobbes.

Portanto, o momento exige resistência, uma vez que estão destruindo todo o arcabouço de proteção criado pelos liberais para estabelecer a paz e a harmonia social, a exemplo do que faz sem qualquer piedade o desgoverno de Michel Temer contra o povo brasileiro.

O Estado mínimo proposto por eles significa, efetivamente, nenhuma prestação de serviços, nenhuma ação social, nenhuma proteção, nenhuma salvaguarda na doença, na velhice, na orfandade. É isso o que desejamos efetivamente, nós, os cidadãos?